TI desde pequenininha
Lucia Almeida teve o que se pode chamar de paixão precoce pela área de TI. E põe precoce nisso. Ela conta que se interessou por tecnologia aos 8 anos de idade e aos 12 já tinha feito curso de linguagem Cobol, desenvolvia pequenos programas e dizia que queria ser analista de sistema, “sem nem saber direito o que era isso”, confessa. A tal ponto que quando entrou para cursar Ciência da Computação na faculdade muito do que via já não era novidade para ela. E não que tivesse alguém na família que a tenha influenciado. Pelo contrário, boa parte dos parentes são professores ou médicos e todos achavam que este seria seu rumo natural. “Nasci com um DNA meio esquisito”, brinca.
Ainda na faculdade, Lucia começou a trabalhar na Bayer, que atua nas áreas de Química-Farmacêutica, a partir de onde diz que foi criando o que chamou de multidisciplinariedade em TI. “Lá eu cuidava de tudo: mainframes, suporte, programação, impressão e fui desenvolvendo uma aptidão para múltiplas funções.” E entre projetos precursores para a ocasião, participou da montagem da primeira rede Windows instalada em uma empresa no Rio de Janeiro.
Na FURP – Fundação para o Remédio Popular, o laboratório farmacêutico oficial do Governo do Estado de São Paulo vinculado à Secretaria da Saúde, que segundo Lucia vivia uma crise operacional, ela assumiu como líder da área de TI. Lá desenvolveu três planos diretores: o primeiro para colocar em operação a indústria, automatizando estoque e toda a logística, duplicando a capacidade produtiva e triplicando o faturamento; o segundo foi o que deu origem ao Dose Certa, programa de assistência farmacêutica do Governo do Estado de São Paulo para melhorar o acesso da população aos medicamentos no âmbito da Atenção Básica à Saúde a partir de inteligência na área de dados. Participou, inclusive, da concepção do projeto de Quebra de Patente e Lei do Genérico junto ao Ministério da Saúde. O terceiro foi a criação de uma fábrica de medicamentos oncológicos. Segundo Lucia, foram dez anos com processos muito disruptivos “e foi também uma das primeiras implementações de ERP no Brasil”, diz.
Na América Latina Logística, o grande desafio de Lucia à frente da TI foi unificar as instâncias de tecnologia das quatro empresas que com a privatização passaram a fazer parte do grupo, sendo três estatais. Cuidou também do planejamento e priorização de projetos e de toda a infraestrutura, manutenção de vias e dos trens e implementou a comunicação via satélite para locomotivas, além da logística multimodal que incluía ainda o aéreo e o marítimo. Na ocasião, participou de todo o planejamento estratégico da companhia, além da TI, incluindo também gestão de pessoas e a mudança de cultura de empresa estatal para companhia privada.
Em seguida, Lucia recebeu um convite da Construtora Camargo Corrêa para a montagem do Centro de Serviços Compartilhados da companhia. “Montamos o CSC do zero, envolvendo 46 nichos de negócios diferentes, todos os sistemas, infraestrutura, telecomunicação, telefonia, suporte técnico e o próprio SAP, já instalado, que necessitava de uma reorganização para empresas do grupo como Engenharia, Alpargatas, Santista, CCR, Cimento Cauê, entre outras.
O conhecimento de Lucia na área farmacêutica, incluindo a quebra de patentes e a Lei dos Genéricos, motivou o convite do Laboratório Aché, empresa familiar passando por processo de profissionalização, onde trabalhou com automação industrial, automação comercial e inteligência de mercado. Lucia foi responsável por trazer o Galaxy Note para o Brasil antes mesmo de ser lançado no mercado nacional e distribuiu o equipamento na mão de três mil representantes de vendas. Ela lembra que na época as pessoas reclamavam que era muito grande para ser celular e muito pequeno para tablet, “mas acabou virando uma febre.”
O passo seguinte foi na APEX – Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos onde foi convidada a atuar na profissionalização de empresas, participando também na mentoria de novas empresas, inclusive startups. “Para mim foi mais uma escola onde tive oportunidade de aprender sobre segmentos que eu nunca tinha passado como agro e outros.” Entre os projetos daquela época, Lucia lembra da montagem do Lab da Gol, onde foram desenvolvidos o sistema de reconhecimento facial no self- check in via aplicativo e serviços de mensageria com informações para o passageiro sobre trânsito para o aeroporto e outras utilidades, como possibilidade de antecipação de vôo…. E acrescenta que este momento marcou uma conquista da área de TI no relacionamento com as áreas de negócio, “foi algo reconhecido por todos.”
A empreitada seguinte foi atender o convite dos conselheiros do grupo Alfa, formado pela C&C – Casa & Construção, La Basque, Águas Prata, Agropalma, Rede de Hotéis Transamérica, o Expotransamérica assim como o Teatro e Rádio Transamérica. Participou da criação do Alfa Lab, com foco no desenvolvimento de startups e transformação digital, atendendo também o Banco Alfa. “Digo que na C&C fizemos a transformação digital de 20 anos em dois.” Entre os projetos disruptivos do processo Lucia destaca o app, segundo ela uma quebra de paradigma enorme porque na época, 2018, não se acreditava que as pessoas pudessem comprar material de construção e de decoração por meio de um aplicativo. E lembra: “nossa primeira venda real foi de 80 mil reais. E não se tratava de teste”, ressalta, acrescentando que isso abriu portas para acelerar a mudança de processos antigos em todas as empresas do conglomerado.
O desafio seguinte foi a participação no reposicionamento estratégico da Restoque, que estava se tornando Veste, que possui marcas para diferentes públicos, tanto feminino quanto masculino: Le Lis, Dudalina, John John, Bobô e Individual. A constituição do comitê de Digital unificou a tecnologia à estratégia corporativa, e em dois anos a TI trabalhou em mais de 300 projetos de melhoria operacional e aceleração do digital. Segundo Lucia, a adoção da plataforma Vtex levou à maturidade do e-commerce e de cybersecurity.
Nesta trajetória, Lucia destaca a solução do PDV dentro do objetivo de ter uma jornada mais fluida do cliente por meio de um aplicativo que o vê como único a partir de sua entrada na loja física por meio da rastreabilidade de dados históricos e de suas preferências em compras anteriores. “Criamos um carrinho digital dentro da loja física permitindo ao vendedor ser pró-ativo em apresentar outros produtos e ofertas.” E acrescenta que com essa integração com o e-commerce o próprio cliente pode, já em casa, verificar peças que separou e que decidiu não levar mas que eventualmente venha a mudar de ideia.
Em seu primeiro ano no grupo, Lucia conta que cortou o orçamento em 35% por meio de governança e definindo cirurgicamente onde aplicar os investimentos. O uso de inteligência artificial já é realidade também no grupo Veste e há o incentivo para as áreas de negócio fazerem uso da IA. E ela comenta a ideia de um funcionário de uma das fábricas para a análise da qualidade dos tecidos, já colocada em prática. “Acho o máximo essa oportunidade de pensar e rapidamente construir a solução, independente da área de tecnologia”, reforça.
Lucia atua também como membro de Conselho de Tecnologia e Transformação Digital de algumas empresas de tecnologia, apoiando-as em seu reposicionamento estratégico para um crescimento sustentável no mercado onde atuam. Contribui também com diretrizes sobre a fusão da tecnologia com a estratégia de negócio, de forma a acompanhar a evolução do mercado, da sociedade e do consumidor. Além disso, atua como mentora contribuindo para o desenvolvimento de novos líderes e em programas sociais, em especial para diversidade e inclusão social.