Crescimento Turbinado
Uma empresa brasileira de pouco mais de 20 anos que chegou para brigar com antigas gigantes de eletrodomésticos portáteis e que conseguiu abrir seu espaço com um faturamento próximo à R$ 6,5 bilhões, crescendo dois dígitos desde a sua fundação, em 2000, e contando atualmente com mais de 7 mil colaboradores. Estou falando da Mondial, marca conhecida no segmento de ventiladores, air fryers, cuidados pessoais e outros produtos e que em 2020 comprou a fábrica da Sony em Manaus, transformando-a em sua segunda linha de produção, a primeira está situada em Conceição do Jacuípe, na Bahia. A empresa exporta seus produtos para Argentina, Paraguai e começa a vender, também, para os Estados Unidos e está iniciando a produção de áudio e vídeo, com televisores, caixas de som e uma variedade de produtos de alta tecnologia com a marca Aiwa, que pertencia à Sony. E no roadmap, a previsão de fabricar em breve produtos da chamada linha branca, começando por aparelhos de ar condicionado, também com a marca Aiwa.
E a minha conversa para a produção desta “Bastidores da TI” foi com Joab Brito, CIO da Mondial, que há 32 anos atua em tecnologia e chegou à empresa em abril de 2021, em plena pandemia. Ele diz que a TI foi quem o escolheu e sua história começa com um antigo computador XT ganho do irmão mais velho. Joab tinha então dez anos e passou a montar e desmontar o equipamento, se familiarizando com a máquina. Pouco depois imprimia trabalhos escolares na impressora que veio junto e cobrava pelo serviço. Com menos de 14 anos já trabalhava em uma prestadora de serviço de TI e conta que um dia a impressora do presidente da empresa deu problema e ele conseguiu compartilhar o micro do executivo com o da secretária. E assim virou técnico de TI.
Como técnico, Joab passou pelo Grupo Pão de Açúcar, onde trabalhou com infraestrutura desenvolvendo, entre outras coisas,, a comunicação de lojas com a matriz. Também com foco em infraestrutura trabalhou em uma indústria de borracha e na Procwork, hoje Sonda. No laboratório Wyeth, posteriormente adquirido pela Pfyzer, foi coordenador de infraestrutura e seu lado comunicativo o levou para a área comercial. “A indústria farmacêutica é uma área muito interessante e nesta época conheci o pessoal da BCS, uma desenvolvedora especializada em sistemas jurídicos, mais tarde comprada pela Totvs, que me chamou para ajudá-los na abertura da filial de Campinas para atender o interior paulista”, conta Joab.
Na etapa seguinte, Joab assumiu seu primeiro cargo de gerência de TI na Alert, uma empresa de call center onde coordenou infraestrutura, sistemas e telecomunicações. “No fim do dia as empresas de call center são empresas de tecnologia porque quando você vende um contrato você vende SLA – Service Level Agreement, ou Acordo por Nível de Serviço, vende atendimento rápido, tecnologia etc…” Nos anos seguintes atuou mais uma vez na área comercial, agora em empresas de mídia out off home como a JB Tech e OrionPC, fornecendo software e hardware para organizações como Elemídia, de mídia de elevadores, JCDecoux, mídia em mobiliário urbano, entre outas. “Mas sempre fui muito técnico”, afirma Joab, o que acabou por levá-lo de volta à essência da TI.
Em 2018, assume novamente a gestão técnica retornando também à indústria farmacêutica, desta vez na Natuab. “Me reconectei comigo mesmo”, afirma e um dos primeiros desafios foi a implantação do novo ERP na empresa que migrou para o SAP S4/Hana para atender a complexidade da regulamentação do setor determinada pela ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. “Implantar um ERP é sempre um desafio muito grande, você mexe com a cultura da empresa, movimenta todas as áreas de negócio, por isso implantação de ERP não pode ser um projeto de TI e sim um projeto corporativo, se não tratar desta forma a chance de insucesso é grande”, afirma.
Em abril de 2021, viveu o processo que o levou à Mondial onde encontrou um ambiente que batizou de “mato alto”. E explica: “a empresa viveu um desenvolvimento muito grande em um curto espaço de tempo e as áreas de back office acabaram ficando para trás, o que é normal num crescimento tão exponencial.” “E chega uma hora que você tem que mexer, tem que se adequar ao processo. E foi nesta hora que eu cheguei, no meio da pandemia.” Uma coisa curiosa que Joab conta é que, ao ver seu currículo de recente implantação de SAP, já durante a entrevista os sócios mencionaram que a empresa tinha um ERP há mais de 20 anos, praticamente desenvolvido em casa, do qual muitos reclamavam mas que, a despeito das reclamações a companhia nunca tinha deixado de produzir, expedir e faturar. “Ou seja, ficou claro que a ideia não era trocar o ERP”, diz.
Joab conta que naquele momento a Mondial tinha acabado de adquirir a planta da Sony, em Manaus, para a produção de áudio e vídeo. “Estes produtos têm um nível de complexidade bem maior do que aqueles que fabricavam até então”, completa e dá como exemplo o número de peças de um ventilador, da ordem de 40, contra 800 de uma TV. “E para controlar tudo isso é necessário um sistema de gestão robusto e eficaz.”
Na visita à nova fábrica de Manaus, Joab diz que o diretor da planta estava bastante preocupado e afirmava que o sistema de gestão em uso não daria conta do que estava previsto para aquela planta. Joab diz que a passagem pela área comercial lhe garantiu um speech que o permitiu entender o motivo das objeções e buscar superá-las. O resumo da ópera é que em cinco meses aconteceu o kick off para a implantação do SAP. Joab diz que havia um apelo de todos mostrando que o sistema em uso já não atendia às necessidades da empresa. “E montamos um business case tão legal que ficou quase impossível não aceitar a mudança. Usamos a metodologia de implementação rápida Activate, da própria SAP, e conseguimos convencê-los”, conta triunfante.
Joab destaca que outro fator de sucesso foi a transparência. “Deixamos muito claro para o board a complexidade de implantação de um ERP deste porte, todos os desafios explicando que não seria fácil e trouxemos todas as áreas de negócio para o projeto.” E acrescenta: “acredito muito que sozinho vamos mais rápidos, mas unidos vamos mais longe.”
O projeto teve início em novembro de 2021 e em Junho de 2022 foi feito o primeiro Go Live em uma das empresas do grupo, em outubro do mesmo ano o segundo Go live em outra empresa do grupo e em 08 de janeiro de 2023 foi feito o Go Live no que Joab classificou como a nave-mãe. “Foi um sucesso. Não ficamos nenhum momento sem produzir, faturar e expedir”, afirma, mesmo admitindo os desafios enfrentados no caminho com a consultoria que trabalhou junto com a equipe interna. Segundo Joab, o mais interessante é que um ano depois da implementação completa é unanimidade entre todos os diretores que a empresa não teria alcançado o crescimento que vem vivendo se não tivesse sido feita a troca do ERP naquele momento. “Foi fundamental para a estratégia da companhia e para seu roadmap de crescimento”, reforça.
Depois do ERP, Joab comenta que a equipe de TI da Mondial fez um Go Live a cada dois meses com a implementação do pacote de logística da própria SAP (EWM); a mudança de estrutura de firewalls; a substituição do console de segurança da companhia, que passou a usar soluções de alta tecnologia; a migração de infraestrutura de colocation local para nuvem, hoje 60% do ambiente está na AWS , e a área de TI foi verticalizada em cinco pilares: sistemas, infraestrutura, projetos e processos, inovação e SAP, totalizando 47 colaboradores diretos, além dos indiretos. Todo este processo levou à criação da cadeira de diretor de TI em agosto de 2024 e de uma nova empresa, a MKTech, um spin off da área de tecnologia da Mondial para atender o mercado. “Acredito que este ano de 2025 o mercado vai ouvir falar deste nome”, adianta.
Hoje, a TI da Mondial está com foco em inteligência artificial por meio de uma parceria com a AWS para que a empresa consiga ter relatórios mais preditivos, com maior nível de riqueza de informações e mais agilidade no modelo de BI. Joab diz que uma de suas grandes preocupações no momento envolvendo IA é questão de segurança. “Muitas soluções de inteligência artificial hoje não levam isso em conta e as empresas podem vir a ter problemas com informações que caiam em mãos erradas.” E adianta que, por conta disso, o projeto de IA da Mondial em conjunto com a Amazon está sendo desenvolvido em um ambiente confinado, 100% Mondial.
Perguntei ao Joab como ele conseguiu justificar todos os investimentos realizado pela área frente à direção que no começo desta história não queria sequer pensar em trocar o ERP. Ele me explicou que isso aconteceu diante da detecção de ineficiência em alguns processos. Hoje, as três frentes de atuação da TI da empresa rumo à inovação são IA, automação e robotização em busca de maior eficiência nos processos de forma a calcular e apresentar objetivamente o ROI sobre cada solução implementada. “Desta forma fica mais fácil demonstrar para o board quais serão os investimentos, onde estes serão feitos e qual será a taxa de retorno que a empresa terá em cima de cada projeto”, explica. “Se não for assim, vira custo.”
Ele diz que com toda a mudança já realizada, as áreas estão passando a ter novas necessidades em termos de ferramentas para ter mais agilidade na análise de dados para a tomada de decisão. “Assim, quando a empresa decide partir para um lançamento novo ela já está munida dos dados necessários para prever a reação do mercado. Este é o papel que eu entendo que a TI tem que ter frente ao negócio, trazer subsídios para o crescimento”, conclui.